quinta-feira, 11 de março de 2010

Geração Y, geração Z e o futuro do trabalho

Uma das coisas que me inquietava era pensar em como as crianças de hoje se adaptariam as estruturas hierárquicas das empresas amanhã, quando precisassem entrar no mercado de trabalho. Falo isso, porque todo mundo vê que a maioria das crianças dessa geração não demonstra o menor respeito por regras ou pela liberdade das outras pessoas. O foco é o "eu quero". Há vinte anos,crianças ajudavam nos afazeres domésticos, mesmo que com coisas mínimas. Com 7 ou 8 anos eu já tinha que espanar o pó e secar a louça. E, sim, nós respeitávamos as professoras nas escolas. Se passássemos uma rasteira enquanto uma caminhasse, como aconteceu ano passado no local onde minha mãe trabalha,seria expulsão na certa. Hoje, apenas se chama os pais que vão alegar que o coitadinho é muito jovem para entender o que se passa. Nós crescíamos com um senso de obrigação muito maior do que de prazer, o que não quer dizer, necessariamente, que éramos mais felizes.

Até então, eu imaginava que quando essas crianças crescessem teriam uma espécie de choque com a realidade. Criados em um mundo imaginário, onde eram reis e princesas, em que todos faziam as suas vontades, teriam dificuldades para entender que, na vida, a gente começa de baixo e não direto, digamos, na posição de diretor de empresa, decidindo o que deve e o que não deve ser feito.

Mas eis que lendo uma matéria (acho que foi na Zero Hora, mas não consegui encontrar mais a fonte depois), mudei totalmente a minha visão. De repente, me dei conta de que essas crianças e jovens - as chamadas gerações Y e Z - não vão precisar se adaptar tanto a regras e hierarquias quando chegarem ao mercado de trabalho. As empresas é que vão mudar. Estruturas hierárquicas rígidas e  horários de trabalho inflexíveis tendem a desaparecer. Ferramentas de comunicação online, como o MSN vão deixar de ser um problema, para tornar-se uma forma rápida de interação entre setores e, mesmo de busca por soluções. Afinal, quem melhor do que aquele seu ex-colega de trabalho que está no Canadá para lhe ajudar a resolver um bug no sistema que ele desenvolveu e no qual você hoje dá manutenção?

Sem flexibilização de regras, grandes empresas não reterão grandes talentos e tendem a perder empreendedores criativos, o que fatalmente lhes levará ao desaparecimento. Deve-se ter em mente que o importante pra geração que já está por aí não é construir uma carreira sólida em uma empresa: o objetivo é a satisfazer objetivos pessoais, trabalhando naquilo que se gosta. Nesse sentido, propostas como a da Natura são bem interessantes. Para selecionar seus trainees, a empresa apostou num modelo de seleção de que prioriza candidatos que acreditam na proposta da empresa e se identificam com seus valores, como a capacidade de aprender, o respeito ao meio ambiente e à sustentabilidade. E fez tudo isso através de mensagens virais pela web, sem identificar-se como empresa, num primeiro momento.

Proposta semelhante eu vi em uma das áreas de desenvolvimento de software na Globo.com há cerca de dois anos. Havia um gestor de equipe, mas os profissionais do time poderiam assumir diferentes papeis, dependendo do projeto. Você poderia ser líder de determinado projeto e em outro ser um programador. Era aplicada uma metodologia chamada "Scrum" (bastante conhecida na área de Tecnologia da Informação, mas não tão conhecida em outras áreas) que se adequa muito a esse novo mundo empresarial. Os times se reúnem diariamente por 15 minutos e todos os membros tem igual tempo para manifestar-se nesse período, sem maior preocupação com quem seja o líder naquele momento.

Enfim, é certo que o universo do trabalho está mudando. E quem sabe no futuro, também se mudem algumas regras no rígido universo da justiça, como aquela do STF, que proíbe "a entrada de pessoas calçando chinelos, tênis, sandálias ou calçados estilo 'sapatênis', assim como trajando qualquer peça de roupa de tecido jeans" em suas sessões.

Um comentário:

Luciano Pillar disse...

Ótimo texto Anelise.

Acho que muitas coisas mudaram bastante nas últimas décadas, incluindo nossos hábitos e relações profissionais. Mas, pessoas são pessoas.

As crianças e jovens de hoje criaram-se sendo estimuladas a ter coisas e a receberem muitas informações. E logo. E ainda cresceram num mundo onde ser jovem é bem visto. Assim, elas tendem a se sentir muito especiais e também dependentes de tudo o que o mundo tem para lhes oferecer. Neste contexto, fazer carreira numa única empresa pode não ser, pelo menos no início de suas vidas profissionais, o que almejam. E respeitar as instituições e os mais velhos pode também não ser tão importante.

Resultado: as empresas também mudam para abrigar as novas necessidades de relacionamento com seus funcionários.

Mas, como pessoas são pessoas, as crianças de hoje são seres humanos com as mesmas necessidades das de ontem. Amor, respeito e valorização pessoal sempre serão necessários. Conheço muitas crianças que são criadas por pais que lhes ensinam os verdadeiros valores humanos e que, assim, não desrespeitam os outros e o mundo.

E as empresas, para reterem os bons profissionais, terão que ser, cada vez mais, boas para eles. A excessiva exploração pode não ser o caminho mais apropriado. Mas, e sempre tem um mas, todos sabemos que ainda há muito trabalho escravo.

No futuro, quando formos mais evoluídos, não nos apegaremos mais tanto às coisas físicas e nem vincularemos trabalho com dinheiro e este com sobrevivência. Aí sim, estaremos começando a verdadeira civilização.